sexta-feira, 4 de junho de 2010

Inveja

Quem disse que inveja é um sentimento apenas ruim? Eu mesma tenho inveja de muita coisa e não me sinto mal por isso. Talvez seja porque a minha inveja nunca foi de coisas materiais. Nunca tive o tênis colorido da Redley, nem o All Star cano longo, muito menos a mochila emborrachada da Company, ícones da década de 80. Mas nunca invejei quem os tinha.

Tenho inveja é de quem come besteira o dia inteiro e não engorda. De quem ataca a geladeira no meio da noite e volta pra cama pra dormir o sono dos justos sabendo que não aumentou um centímetro a silhueta. Tenho inveja de quem não tem medo de avião, apesar de eu mesma não ser das mais medrosas. Mas tem gente que não admite a hipótese do avião cair e se sente mais seguro ali do que dentro da própria casa. Tenho inveja de quem dorme em qualquer lugar, qualquer mesmo, com a facilidade que não tenho nem nos meus sonhos. Daqueles que dormem no meio da frase, com a cabeça pendurada e o bocão aberto, na maior, sem cerimônia.

Tenho inveja de quem consegue manter o esmalte na unha por até quinze dias sem soltar uma casquinha sequer. Tenho inveja de quem canta horas a fio sem perder a voz. A gente torcendo praquele sujeito (ou, na maioria das vezes, sujeita) que fala pelos cotovelos e grita mais do que todo mundo ficar rouco, e nada. Já eu, se falar por duas, três horinhas numa festa, to perdida. Tenho inveja de quem consegue ter orgasmos com alguém que nunca viu na vida, logo na primeira noite. Meu corpo, e certamente minha cabeça, precisam de mais tempo.

Tenho inveja de quem tem memória de elefante. Eu costumo ser a melhor pessoa para se confiar um segredo, porque alguns dias depois já nem vou me lembrar o que me contaram. Tenho inveja de quem tem talento nato pra praticar esporte, qualquer que seja. Eu sempre fui um zero à esquerda. Era a penúltima da turma do colégio a ser escolhida pra jogar no time de vôlei ou handebol. Sim, penúltima, ainda havia uma garota pior do que eu, a coitada. Isso marcou a minha infância (ainda bem que pra ser repórter esportiva não é preciso saber jogar nada). Tenho inveja de quem tem tempo sobrando, de quem tem habilidades manuais incríveis, de quem sabe desenhar, de quem tem idade suficiente pra tentar.

Algumas invejas já foram solucionadas, quer pela tecnologia, ou pelas circunstâncias da vida. Tinha inveja de quem tinha cabelos lisinhos, escorridos, daqueles que não seguram nem um grampo. Há algum tempo, a escova progressiva me trouxe essa alegria. Tinha inveja de quem falava muitos idiomas estrangeiros. Hoje em dia falo quatro. A inveja pode não ter nada de nobre, mas muitas vezes é aquela coceirinha que faz a gente se mexer e querer ser alguém um pouco melhor. Quando menos se espera, a inveja vira agente transformador e faz uma preguiçosa virar malhadora só pra ter a bunda daquela modelo; uma ignorante virar leitora voraz só pra saber mais do que aquela garota que se acha a mais inteligente.

E você, tem inveja de quê?

2 comentários:

  1. Tenho inveja de repórteres altas, que escrevem brilhantemente e fazem enorme sucesso com a macharada onde quer que elas vão... Adorei! Bjos

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  2. eu tenho inveja desse blog que está maravilhoso, li todos as postagens, continue assim Karin...

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