terça-feira, 30 de agosto de 2011

Axilas

Ela tem uma bunda de dançarina de programa de auditório. Cabelos de comercial de xampu. Sorriso colgate. Olhos perfeitos. Abdome, pernas, tudo em cima. Mas nada disso é suficiente. Porque agora as mulheres tem que ser gostosas ... nas axilas.

Coube ao escritor Rubem Fonseca sacramentar o que vem a ser um novo fetiche, lançando "Axilas e Outras Histórias Indecorosas". No conto "Uns Braços”, o autor apresenta um personagem obcecado pelas axilas femininas, que desperta este fetichismo após ver uma violinista em ação. Moral da história: agora os homens vão passar a prestar atenção neste cantinho quase esquecido das nossas vidas. Sim, porque só lembramos que elas existem na hora de depilar e passar desodorante. Mas agora, é diferente: como se já não bastasse termos que nos preocupar com praticamente cada centímetro do nosso corpinho, elas, as axilas, serão observadas. Me poupe.

Nosso querido contista tinha que inventar mais essa... que ele nasça mulher na próxima encarnação, pra aprender.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Procura-se

Está em falta. É cada vez mais raro. Difícil de encontrar. Procura-se pelo silêncio. Não falo do silêncio 100%, imagina, moro em cidade grande e não teria essa pretensão. O barulhinho distante, o ruído dos carros passando, o burburinho, não me incomodam. Falo de outro tipo de silêncio, que não encontro mais.

É o casal de idosos no cinema que comenta cada cena, como se estivesse no sofá de sala vendo novela.

É o taxista que insiste em puxar papo, enquanto você só quer admirar a paisagem.

É o restaurante chique, de preço caro, que se tivesse os decibéis medidos, teria praticamente que instalar portas anti-ruído pra não incomodar a vizinhança.

É o celular que toca, o rádio que apita, no meio do concerto, da peça, do filme.

É o cara sentado do seu lado no avião, que conversa sem parar enquanto você só quer dormir.

É o sujeito que, no meio de uma reunião, não consegue ficar calado, tem que fazer uma pergunta, um comentário, ainda que não seja relevante.

É a mulher que passa todo o show do Paul McCartney tagarelando com uma amiga, em vez de sentir a emoção daquele momento, em vez de curtir um silêncio diferente, um silêncio de vozes em coro, em sintonia com a música que vem do palco.

É como se algo obrigasse as pessoas a começarem a falar. Você não tem direito de estar em silêncio, que logo te recriminam: anti-social, metida, antipática, reservada demais, misteriosa.

Eu adoro falar, contar histórias, dividir sensações com quem me interessa. Mas, muitas vezes, preciso do bom e raro silêncio.

Um minuto de silêncio para pensar, para observar, para admirar, para sentir.

Um minuto de silêncio para ler, para escrever, para cantar, para trabalhar.

Um minuto de silêncio para tomar uma decisão, para dizer o que realmente vale a pena ser dito.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Agentes do Destino

O filme ainda está passando, e se você não viu, saiba que vale o ingresso. “Agentes do destino” é mais que um filme polêmico sobre se existe ou não destino. É uma história sobre escolhas, sobre não deixar que ninguém escreva sua vida por você, sobre o amor, sobre pensar no outro, sobre desafiar, sobre saber que só a gente é capaz de mudar o rumo da própria vida.

Um político bem sucedido, que acaba de perder uma eleição para senador, encontra uma mulher misteriosa num banheiro masculino e descobre que ela é o amor de sua vida. Mas alguém lhe diz que o destino deles não é ficarem juntos, e um grupo de agentes, designados pra cuidar da vida de todos os seres humanos, vai tratar de impedir que este romance siga adiante. Só que o cara, certo de sua paixão, faz de tudo pra conseguir escrever um novo futuro - inclusive andar no mesmo ônibus, no mesmo horário, todos os dias durante três anos, pra ver se encontra novamente sua amada.

A história se desenvolve bem mais complexa do que isso, mas no fundo a lição é: não tem essa de destino já traçado. Cabe a você escrever as páginas mais importantes da sua biografia. Ou, trocando em miúdos: não desperdice um sonho porque você acha que não foi feito pra ele, ou que nunca vai acontecer. Não aceite tudo o que os outros te dizem, não se conforme com o que a vida te deu, se aquilo não é o que você realmente quer. Ouse. Desafie. Arrisque. Tente.

Conheço um cara que pensa assim. É bem sucedido, trabalha numa posição em que muitos gostariam de estar. Mas, simplesmente, não é a dele. Ele não encontrou a felicidade completa naquela profissão. E decidiu começar a correr atrás do que realmente o faz feliz. Admiro sua coragem, não sei se, a esta altura da minha vida, faria o mesmo. Mas tenho sorte de ser feliz com o caminho que escolhi. Se você não tem, saiba que o percurso pode ser difícil, mas, pior do que tentar, é passar a vida inteira achando que poderia ter tentado. Pior do que se arrepender do que você fez, é se arrepender do que você nunca fez. Além do mais, na vida real, não existem os tais "agentes do destino" pra tirar você da rota que você escolher. Basta tomar a decisão certa e ser feliz.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Um Drummond

"Definitivo, como tudo o que é simples.

Nossa dor não advém das coisas vividas, mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram. Por que sofremos tanto por amor? O certo seria a gente não sofrer, apenas agradecer por termos conhecido uma
pessoa tão bacana, que gerou em nós um sentimento intenso e que nos fez companhia por um tempo razoável, um tempo feliz. Sofremos por quê?

Porque automaticamente esquecemos o que foi desfrutado e passamos a sofrer pelas nossas projeções irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos de ter conhecido ao lado do nosso amor e não conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter tido junto e não tivemos, por todos os shows e livros e silêncios que gostaríamos de ter compartilhado, e não compartilhamos. Por todos os beijos cancelados, pela eternidade. Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante e paga pouco, mas por todas as horas livres que deixamos de ter para ir ao cinema, para conversar com um amigo, para nadar, para namorar.

Sofremos não porque nossa mãe é impaciente conosco, mas por todos os momentos em que poderíamos estar confidenciando a ela nossas mais profundas angústias se ela estivesse interessada em nos compreender.

Sofremos não porque nosso time perdeu, mas pela euforia sufocada. Sofremos não porque envelhecemos, mas porque o futuro está sendo confiscado de nós, impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam, todas aquelas com as quais sonhamos e nunca chegamos a experimentar.

Como aliviar a dor do que não foi vivido? A resposta é simples como um verso: Se iludindo menos e vivendo mais!!!A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade.

A dor é inevitável. O sofrimento é opcional."

segunda-feira, 4 de abril de 2011

A Essência de cada um

Vi na TV que um italiano que mora em Florença tem um dom especial, talvez único. Ele passa duas horas entrevistando você, uma pessoa comum, que ele nunca viu na vida, e depois de saber um pouco dos seus gostos, da sua infância, do seu relacionamento com seus pais e amigos, dos seus lugares preferidos no mundo e de outros detalhes pessoais, mistura uma porção de essências e cria um perfume exclusivo, que leva o seu nome no rótulo e é um resumo daquilo que você é. Incrível. Fiquei com vontade de ir até lá nas minhas próximas férias só pra ver se o “Eau de Karin” combinaria mesmo comigo. Imagina se pudéssemos realmente colocar um pouquinho da gente num vidrinho, qual seria o resultado?

Misture um pouco de impaciência, uma dose de preguiça, um sopro de comodidade, uma pitada de ansiedade, e este seria o perfume dos meus defeitos.

Agora, abra outro vidro e pingue uma gota de amabilidade, um punhado de inteligência, uma dose de honestidade, um pouco de sensibilidade, e pronto: taí o perfume com o melhor de mim.

Bom mesmo seria se conseguíssemos pegar esse perfume defeituoso e mandá-lo pelo ralo junto com nossos defeitos reais. Queria muito ser mais paciente com as pessoas, não ser tão ansiosa, ter mais iniciativa no trabalho, ser mais companheira das amigas. Mas o tempo anda tão rápido que, quando a gente vê, não conseguiu mudar. É como aquela listinha que a gente faz todo mês de dezembro com as resoluções de Ano Novo: se dez por cento virarem realidade, já é um avanço.

Queria poder criar um perfume com tudo o que eu gostaria de ser e que, a cada gota que derramasse em mim, minha vida se encaminhasse na direção de todas aquelas coisas boas. Imagine só! Num instante seria rica, sarada, falaria todos os idiomas do mundo, entenderia tudo de arte, política e economia, teria juventude eterna e saúde pra dar e vender. A propósito, se alguém vir num programa de TV que existe um especialista neste tipo de perfume, me avise que eu vou voando.

quinta-feira, 17 de março de 2011

QUANDO A VERDADE DÓI

Minha mãe me ensinou a sempre dizer a verdade, no matter what. Mas, hoje em dia, já não sei se é a melhor estratégia. Veja o brasileiro dono do Burger King. Dava uma palestra nos Estados Unidos, para americanos, e caiu na besteira de falar a verdade. Disse que na Inglaterra as mulheres não são o ideal de beleza e que a comida é intragável. E ele não está absolutamente certo? Quem disser que não, nunca foi ao país da rainha. Pois a “ofensa” foi parar na internet em questão de minutos e, algumas horas depois da “gafe”, o bem-sucedido empresário teve que vir a público pedir as mais deslavadas desculpas e dizer que foi mal interpretado, que não era bem assim, coisa e tal. Punido por dizer a verdade (faltou falar da moda, que também é um horror... ih, periga eu também ter que vir a público me desculpar por essa).

Outro caso recente é o do Muricy Ramalho, ex-treinador do Fluminense. Ousou dizer que o local de treinamento do time é ruim, que o gramado está cheio de buracos, que um rato –veja só, que horror- veio dar as boas-vindas ao Deco, e que a presença de roedores é comum na outrora chique sede das Laranjeiras. Se eu fosse o presidente do clube –ou, neste caso, o ex-presidente, que reinou absoluto durante anos e nada fez pra melhorar esta situação- teria vergonha de ver um funcionário meu divulgando este tipo de coisa e agiria no dia seguinte. Mas... o que foi que aconteceu? O Muricy acabou se desgastando por conta disso, e pediu pra sair. E ainda foi criticado por ter dito a verdade, somente a verdade, nada além da verdade. Juro.

Esta história de ser politicamente correto já encheu. É tão comum não podermos mais expressar nossa opinião, que outro dia vieram me censurar no twitter, dizendo que, por ser jornalista, eu tenho a obrigação de ser imparcial. Só porque eu tava criticando um jogador no microblog. Gente, o twitter não é meu trabalho, ora bolas, é diversão! Lá, eu sou eu, Karin, e não uma funcionária global. Respondi ao follower dizendo que tinha sim o direito de emitir opinião ali, e, graças a Deus, fui apoiada por muita gente.

Em nome do politicamente correto, daqui a pouco todo mundo vai falar igualzinho a jogador de futebol: “fiz dez gols? ah, mas meu objetivo não é ser artilheiro não, o que importa é que meu time ganhe o campeonato.” Ou: “40 mil pessoas gritando o meu nome? Ah, legal, mas bom mesmo é poder estar ali ajudando meus companheiros.” Ou ainda: “cinco derrotas seguidas? O time tá se empenhando, é só a bola que não tá entrando.” Mentira, mentira, mentira. É nessas horas que eu prefiro ouvir o Renato Gaúcho, o Joel Santana, o Romário, caras que falam o que pensam, sem papas na língua. Livres, leves e soltos. Já basta vermos os políticos mentindo pra ganharem voto. Eu apóio quem levanta a mão e diz uma boa verdade, doa a quem doer.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Tenho 39 e não estou casada, não tenho filhos e não sei dirigir. Você acha que sou fracassada?

(Reproduzo o texto que li na revista TPM. Sensacional!)


Por Nina Lemos

Eu tenho 39 anos e não estou casada. Não tive filhos e isso não está nos meus planos urgentes. O sonho da casa própria ainda espera (até quando?). E, não, eu não tenho carro, porque eu não sei dirigir. Se você pensa que eu sou uma ótima cozinheira e ofereço jantares finos para os amigos, esqueça. Eu não sei nem fazer arroz.

Essa sou eu, Nina Lemos, 39 anos, uma loser, prazer.

Se eu fosse homem, eu não teria que explicar nada. Nem escrever este texto. Eu estaria apenas aproveitando a vida. Seria um cara foda. O único problema seria eu não ter carro, claro.
Como eu sou mulher, posso fazer uma lista para provar para vocês que eu não sou uma loser. Será que isso é necessário?

Na dúvida... Tenho bom coração e sou cercada de amigos que me amam. Tenho 20 anos de análise e adoro criança. Já me apaixonei por homens que também se apaixonaram por mim e sou amiga de boa parte dos meus ex-namorados. Ainda vou me apaixonar outras vezes, claro. E, se você tem 27 anos e acha que ter quase 40 é fazer parte de uma outra dimensão, eu aviso. Não é. A gente é a mesma pessoa. Só que menos neurótica (se você fizer esforço para isso, claro).

E profissionalmente, no mundo atual, não existe estabilidade, o que é ótimo. OK, eu poderia ser funcionária de uma estatal, mas morreria de tédio. No meu caso, trabalho em casa, tenho liberdade para escrever sobre coisas de que gosto. Algumas pessoas dizem que o que eu escrevo as ajuda. E, ah, eu lancei sete livros e um romance, que eu escrevi sozinha! Não estou rica. Mas esse nunca foi meu objetivo. Não preciso de muito dinheiro, graças a Deus. E agradeço por isso todos os dias. Pago as minhas contas escrevendo. Nunca achei que isso fosse possível, nem nos meus mais ambiciosos sonhos adolescentes.

Satisfeita? Se eu estivesse casada e tivesse três filhos, e ainda soubesse cozinhar e dirigisse uma picape para pegar as crianças na escola, talvez eu não precisasse contar tudo isso. Eu seria inserida na sociedade com destaque automaticamente, com direito a alguns pontos de milhagem.

Sim, eu já me senti freak muitas vezes. Principalmente no Natal, quando todos têm filhos e maridos e eu não. Mas depois de algumas viagens para Berlim (onde as pessoas de 40 anos podem ser alternativas sem serem consideradas loucas) e os tais anos de análise passei a achar que tudo bem.

Na verdade, passei a achar que tudo ótimo. Eu sou uma pessoa legal e contente com a minha vida (nem sempre, claro!). Quase todos os meus amigos são meio parecidos comigo. No sentido de estarem ligados no que está acontecendo. A Costanza Pascolato, que tem 70, me disse outro dia que largou as filhas indo a museus em uma viagem a Londres e foi com o neto para o rock. Ela ganhou dele um anel de caveira e não o tira por nada. Vocês acham que a Costanza é louca?

Algumas pessoas da minha família já devem ter achado que eu era. E por isso arrumaram uma maneira de me rotular. Elas acham que eu sou artista. Eu não contrario. Se é mais fácil para elas pensar assim, tudo bem. Mas e se eu não escrevesse livros, não aparecesse de vez em quando na televisão nem mostrasse minha cara aqui na Tpm? Aí eles iam achar que eu era o quê? Só “artista” pode ter 39 anos e não ser casada nem ter filhos?

Não era para ser assim, mas é. Tenho muitas amigas da minha idade solteiras e sem filhos. E também tenho amigas casadas e com filhos. Todas ficam insatisfeitas às vezes porque a vida não é fácil. E aquelas que pararam de trabalhar para cuidar dos filhos se acham losers e às vezes até inventamos um campeonato.

– Eu vou fazer 40 anos, não tenho filhos e tô solteira!
– E eu que fiz mestrado e hoje sou só uma mãe? Se eu não arrumar um emprego de novo antes de fazer 40 vou me matar.

Brincadeira macabra essa, não?

Mas não, nada disso. Nós não somos losers, baby. Nós somos incríveis (na maioria das vezes).

PS.: Nina Lemos está solteira, mas pode estar casada quando você estiver lendo este texto.

sábado, 29 de janeiro de 2011

Hora do Recreio

Outro dia um amigo que me conhece há 14 anos olhou pra mim e disse: “você tá feliz, não tá?”. Dei um sorriso como resposta e ele entendeu. Você se lembra da última vez em que sentiu uma felicidade plena, sem que nenhum fator extraordinário tivesse causado essa sensação? Algo como a felicidade que você sentia quando tocava o sinal do recreio. Era uma alegria, uma sensação de liberdade, de saber que naqueles próximos 30 minutos você podia fazer o que quisesse, não era? A hora do recreio era hora de brincar, de fofocar com as amigas, e, mais tarde, de paquerar. Era o momento de se inserir naquela sociedade formada por outras crianças e adolescentes, de mostrar quem você realmente era. A hora do recreio era sagrada, era especial, ninguém queria perder. Me lembro até hoje de como fiquei decepcionada quando minha irmã mais velha, ao chegar à faculdade, me contou que lá não tinha recreio. “Como assim, não tem recreio? Deve ser muito sem graça essa tal de faculdade...”


Eu não tenho mais recreio faz tempo, mas sei que é possível viver como se ele existisse. Que tal acordar um pouco mais cedo pra dar um mergulho antes do trabalho? Ou sair do serviço uma hora antes pra gargalhar numa peça de teatro em plena segunda-feira? Pegar um cineminha no meio da tarde de uma quarta? Não é uma felicidade? Podem parecer coisas simples, mas há quanto tempo você não faz uma delas? São escapadinhas como essas que trazem de volta aquela sensação de liberdade que você tinha quando criança, quando não precisava ser responsável, nem cuidar de ninguém. Aquela sensação da hora do recreio. Experimente só. Meia horinha por dia de “autos” faz um bem danado. Ah, e se tiver um lanchinho gostoso no meio, então, hum...melhor ainda.